Carlos Felipe ama

24-11-2010 20:21

Carlos Felipe, como todos os jovens, percebe a delicadeza, a beleza e o carinho das pessoas e se afeiçoa a elas.  Tem a consciência que o relacionamento afetivo entr duas pessoas depende das duas e, quando perguntado se tem namorada, ele responde: "ainda não".

O texto abaixo faz parte dos registro sobre o dia-a dia com Calos Felipe e está publicado no livro Um Autista Muito Especial,  Deusina Lopes da Cruz, Editora Mediação, 2008.


(...) A Mariana a quem o médico se refere no seu parecer  sobre a avaliação que fez sobre o Carlos Felipe naquela consulta era uma colega de sala de aula que ele gostava muito. Esta importante novidade foi registrada por mim nos escritos que fazia sobre ele  no dia 28 de março de 1995, quando ele tinha 13 anos e dois meses. Neste período, a Diretora da Escola  onde estuda me falava  com frequência que a  aluna colega de sala Mariana, a mãe dela e a professora  dele estavam reclamando do comportamento do Carlos Felipe com a Mariana (corria, esbarrava nela, puxava os cabelos e etc e ela estava assustada com medo de ser machucada e meio constrangida com a situação). Eis a minha conversa com o Felipe sobre a Mariana:

-                Felipe me fale sobre a Mariana...

Ele respondeu:

-                Eu estou apaixonado.

Eu, aparentemente calma, falei:

-                Bem, essa coisa de paixão, namorada etc é coisa de gente beeeeem grandona. Você não acha que ela é apenas sua amiga de Escola, uma amiga que você gosta muito?

Ele respondeu:

-                É, não é minha namorada.

Eu continuei:

-                O que você conversa quando chega perto dela?

Ele respondeu:

- Ela disse que vai me telefonar amanhã.

Eu perguntei:

-         Quando ela telefonar o que você vai falar?

Ele respondeu:

-         Muitas coisas.

Quis saber:

-         O quê, por exemplo?

Ele respondeu:

-         Eu quero uma foto de mil faces. Eu e ela vamos escolher as que têm face sorrindo, séria, brava etc. Eu quero colocar as fotos dela nas paredes da minha sala como o Chico Bento coloca as cabeças dos animais que ele caça e viram troféus colocados  nas paredes da sala da casa dele.

Perguntei:

-         Você não acha que mil fotos são muitas fotos? Talvez ela não tenha mil fotos. Não pode ser só uma foto?

Ele disse:

-         Pode.

Prevendo que alguma coisa não desse certo, falei:

- Bem, foto é uma coisa muito pessoal, é um pedacinho de nós mesmo, como a Mariana ainda é muito garotinha, ela pode ter vergonha de te dar uma foto, ela pode ter vergonha até de te telefonar, porque as garotinhas são assim mesmo, cheias de vergonha. Ela pode não te telefonar amanhã.

-         Por quê? Ela não gosta de mim?

-         Gosta sim, mas amizade com garotinhas é assim mesmo. Sabe, quando você quiser falar com a Mariana, vá devagar, chegue perto, sem pegar nela e pergunte calmamente alguma coisa do tipo: - Mariana, como foi a sua prova de...? Ela vai lhe responder e você sai de perto normalmente. Procure não chegar correndo, esbarrando nela, puxando os cabelos etc, porque ela pode ficar assustada e com medo de ser machucada.

No dia seguinte quando fui buscá-lo na escola, ele vinha na minha direção, quando surgiu a Mariana, ele olhou para mim, olhou para ela, foi até perto dela, perguntou-lhe qualquer coisa e saiu antes mesmo que ela respondesse (acho que nem ouviu a resposta). Dias depois a Mariana lhe deu uma foto na qual se encontravam outras 30 pessoas. Ele perguntou:

- A Mariana não tem uma foto 3 x 4 só do rosto dela?.